16 de julho de 2025

Tempo de Leitura: 3 minutos

Um estudo publicado nesta semana na revista Nature Genetics identificou quatro subtipos bem definidos dentro do espectro do autismo, cada um com características clínicas próprias, padrões genéticos específicos e trajetórias distintas de desenvolvimento. Os autores analisaram dados de 5.392 crianças autistas e 1.972 irmãos não autistas, todos nos Estados Unidos, além de replicar os achados em outra amostra com 861 autistas. Combinando avaliações comportamentais detalhadas e sequenciamento genético, os cientistas propõem uma nova forma de olhar para o transtorno do espectro do autismo (TEA): não como uma única condição com intensidades variadas, mas como um conjunto de perfis diferentes que coexistem sob o mesmo diagnóstico.

Ao invés de focar apenas nos sintomas clássicos do TEA  — como dificuldades de interação social e comportamentos repetitivos —, os pesquisadores adotaram uma abordagem centrada na pessoa, considerando também atrasos no desenvolvimento, comorbidades como TDAH, depressão, deficiência intelectual, e o histórico familiar. A partir disso, utilizaram um modelo matemático avançado de machine learning, chamado GFMM (em inglês, general finite mixture model), que agrupa indivíduos com base em semelhanças e características clínicas — e não nos critérios tradicionais já estabelecidos.

Publicidade
Livro: Autismo — Não espere, aja logo!

Para o geneticista molecular Diogo Ventura Lovato, professor da PUC-Campinas, esse é um dos estudos mais relevantes deste ano. “Ao utilizar dados clínicos e genéticos de alta qualidade associados à mais moderna ciência de dados, os pesquisadores desse trabalho deram um passo extremamente importante para o futuro do TEA. Quem conhece pessoas com diagnóstico de TEA, sabem quão diferentes elas são umas das outras e como isso é um problema para o diagnóstico e perspectivas terapêuticas. Até o momento, a genética clínica consegue auxiliar apenas uma parcela dos indivíduos com TEA, na sua maioria, de casos graves que apresentam deficiência intelectual e outras comorbidades. Nesse estudo, foi possível entender melhor todos os grupos de autistas e como eles são diferentes clinicamente, numa associação holística e não de algumas características isoladas, com a genética. Foi um passo importante que eles deram para que todos nós possamos sonhar em breve com uma melhoria significativa no que chamamos de medicina de precisão genômica para o TEA.”, destacou Lovato, que é biomédico, doutor em biologia molecular e especialista na genética do TEA.

Quatro perfis

O resultado surpreendeu até os próprios autores: os dados apontam com clareza para a existência de quatro grandes perfis de autismo, cada um com combinações únicas de desafios e com alterações genéticas distintas. Algumas crianças tinham mutações raras de alto impacto; outras, uma soma de variantes genéticas herdadas de menor impacto isolado, mas ainda significativas quando somadas em um único indivíduo. Cada perfil também estava associado a um momento diferente da expressão gênica no cérebro em desenvolvimento, em relação ao tempo de vida — como se o “retrato” de cada criança estivesse sendo esculpido por caminhos biológicos próprios desde o início da vida.

Embora esses perfis ainda não substituam os níveis de suporte da quinta versão do Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais (DSM-5), o estudo propõe uma evolução: somar às atuais classificações uma camada mais rica de informação, que permita planejar melhor os apoios, prever comorbidades e até personalizar terapias. “No futuro, talvez possamos dizer que uma pessoa é autista nível 1 de suporte, perfil misto com atraso no desenvolvimento”, sugere a equipe, no artigo científico. Essa combinação de dados clínicos e genéticos, segundo os autores, pode transformar a forma como se pensa o cuidado com pessoas autistas.

Subtipos de autismo

Veja a seguir os quatro subtipos de autismo identificados no estudo, com suas principais características e a proporção que cada um representa entre as crianças autistas analisadas, além do percentual da população identificada com cada subtipo no estudo:

  • Perfil social e comportamental (37% da população estudada)
    Crianças com grandes dificuldades em interações sociais, comunicação e comportamentos repetitivos. Apresentam também altos índices de TDAH e ansiedade, mas sem atrasos no desenvolvimento inicial da linguagem ou da motricidade.
  • Perfil misto com atraso no desenvolvimento (19% da população estudada)
    Crianças que tiveram atrasos para andar, falar e se desenvolver. Também apresentam autismo, mas com presença significativa de deficiência intelectual, transtornos motores e distúrbios de linguagem. Este perfil está associado a características  genéticas herdadas  combinadas a mutações espontâneas, quer dizer, que não estão presentes nos progenitores biológicos.
  • Perfil amplamente afetado (10% da população estudada)
    Crianças com muitos desafios combinados — sociais, cognitivos, emocionais e comportamentais — e maior número de diagnósticos associados, como epilepsia, TDAH e deficiência intelectual. São as que mais precisam de diferentes formas de intervenção e foram as que mais concentraram mutações genéticas de alto impacto clínico.
  • Perfil de desafios moderados (34% da população estudada)
    Crianças com sintomas mais leves ou moderados, com menos comorbidades. Desenvolveram linguagem e habilidades motoras dentro do esperado, mas têm traços de autismo que costumam aparecer mais claramente com o tempo, como na escola ou nas relações sociais.

Estudo publicado

O estudo completo, que foi publicado em 09.jul.2025, na revista científica Nature Genetics, pode ser conferido no PubMed, neste link, ou no site da Nature, com o título “Decomposition of phenotypic heterogeneity in autism reveals underlying genetic programs”.

 

(Publicado originalmente na site da Tismoo)

COMPARTILHAR:

Editor-chefe da Revista Autismo, jornalista, empreendedor.

Fantástico destaca criança autista encontrada amarrada em escola particular no Paraná

PECS para todos: você pode adaptar figuras para garantir acesso e sucesso na comunicação

Publicidade
Assine a Revista Autismo
Assine aqui a nossa Newsletter grátis
Clique aqui se você tem DISLEXIA (saiba mais aqui)