9 de janeiro de 2022

Tempo de Leitura: 3 minutos

Como assim? Autismo não é genético? A pessoa já não nasce autista?

De fato, as evidências que temos atualmente já nos mostram com muita segurança que o autismo é genético de grande carga hereditária. Logo, a pessoa autista já nasce na condição de pessoa neurodivergente. Ninguém fica autista ou pode contrair autismo após o nascimento. Autismo é uma condição de existência para toda a vida!

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Então, por que o título diz que ninguém nasce com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA)?

Eu explico. Há algum tempo, eu já venho batendo na tecla de que ser autista, estar inserido no espectro do autismo e ter uma existência enquanto pessoa neurodivergente não é a mesma coisa do que ter o transtorno.

A condição tem a ver com o ser, com o existir no mundo daquela maneira. O transtorno tem a ver com o ter, com as barreiras que aquela condição de existência em interação com o meio acarretam.

E nesse sentido, começa a ficar mais fácil de entender o porquê de ninguém nascer com o TEA. Mesmo que sua genética lhe coloque como pessoa neurofisiologicamente diferente, ao nascer, ainda não existem essas questões que acarretam o transtorno. Ou, pelo menos, ainda não são identificadas a ponto de ocasionarem prejuízos à interação do ser com as pessoas e o ambiente que o cerca.

O bebê nasce, mama, dorme, faz suas necessidades fisiológicas e necessita das demandas referentes a todas as necessidades humanas básicas como qualquer outro bebê. É fato que, algumas vezes, desde bem cedo, não há o contato visual com a mãe na hora da amamentação como é típico. Porém, naquele momento aquilo serve muito mais às expectativas da mãe do que ao próprio bebê.

Em suma, ele necessita ser alimentado, limpo e aconchegado para seu bem-estar. No decorrer do desenvolvimento, começam os atrasos no que diz respeito aos próprios marcos de desenvolvimento infantil. E aí, por vezes, começam a ser observados mais claramente os sinais do TEA no bebê. Dependendo dos atrasos, da percepção dos pais e dos profissionais e dos prejuízos que esses acarretam, começa a aparecer o transtorno.

E o transtorno tem a ver com isso, com os prejuízos propriamente ditos. A criança, devido a esses atrasos, tende a não desenvolver habilidades básicas que serão importantes para seu desenvolvimento futuro. Um exemplo fácil de entender é sobre a habilidade motora que muitas vezes vem prejudicada na criança autista. Ao não desenvolver bem o movimento de pinça, acaba por ter a aprendizagem prejudicada mais tarde na educação infantil, pois o primeiro é pré-requisito para que o segundo aconteça de maneira adequada.

Mas não são apenas esses atrasos que trazem dificuldades ao desenvolvimento da pessoa. Características próprias da pessoa autista e que não necessariamente tem a ver com uma dificuldade também podem ocasionar um transtorno. O autismo não é só atrasos e coisas negativas. Existem vantagens e potencialidades que pessoas autistas podem apresentar. O hiperfoco é um exemplo. Essa capacidade intensa de se inteirar de algo pode ser uma qualidade tremenda do indivíduo que pode trazer muitas vantagens em relação aos seus pares. Outro exemplo é a capacidade de focar nos detalhes. Por ter uma coerência específica muito forte, a pessoa autista é capaz de observar situações por um prisma que talvez uma pessoa típica nunca seja capaz.

E essas características não carecem de conserto. Elas pedem sim um trabalho de educação que potencialize tais qualidades para que a pessoa com TEA desenvolva sua máxima capacidade. Ainda existem outras questões que, se analisadas criteriosamente, poderemos perceber que o prejuízo se dá pela falta de aceitação dessa maneira atípica de existir da pessoa autista, portanto, esse trabalho de educação necessita de ser amplo, indo além apenas do ser neurodivergente.

Com isso, é preciso entender que a pessoa autista precisa sim de tratamento para suas questões que lhe trazem dificuldade. O transtorno necessita de tratamento, a condição de autista não. E o tratamento desse transtorno tem que abranger o todo e não apenas o indivíduo, pois, como pudemos perceber, as questões que afetam a pessoa não têm a ver apenas com o que precisa ser desenvolvido e trabalhado na pessoa autista, como também com toda uma sociedade que precisa aprender a conviver com toda a diversidade que é natural da nossa humanidade.

As barreiras precisam cair para que nos elevemos enquanto seres humanos.

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Presidente da ONDA-Autismo e membro do Conselho de Autistas; ativista; administrador da página @autiesincero no Instagram, servidor público federal, palestrante e escritor.

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