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Meu nome é Roseli Claro, tenho 53 anos e sou autista.
Eu quero falar sobre como é ser um autista adulto nos dias de hoje no que se refere ao mercado de trabalho.
Meu primeiro emprego foi aos 14 anos, eu etiquetava roupas numa loja do Shopping Morumbi. Depois, entreguei panfletos no Largo 13 de Maio por 2 anos, trabalhei na feira, em lojas e escritórios. Durante minha vida inteira busquei o meu lugar, a minha necessidade de pertencimento sempre foi muito grande.
Só tive a primeira vaga com adaptações para uma pessoa autista em 2018, eu já tinha 48 anos e, naquela época, estava desistindo de mim mesma…
A minha experiência nos empregos anteriores foi muito triste e dolorosa, a exclusão gritava nos meus ouvidos e eu só podia chorar por dentro. Além de autista, venho de uma família humilde, ou seja, eu precisava trabalhar. Além da exclusão e do bullying, temos que lidar com o capacitismo e o preconceito.
O preconceito eu conheci ainda criança, quando no pré primário eu perdia os recreios por não cumprir minhas tarefas. Lembro que as crianças faziam uma fila com a cartilha nas mãos, eu as imitava, mas minha cartilha não estava na página certa e, assim, a tarefa não era realizada. Nunca recebi estrelinhas e observava as crianças brincando de longe. Eu não podia participar, estava de castigo.
O capacitismo também chegou forte batendo na minha porta.
Não entendo porque em algumas situações sou tratada como criança. Não sou criança. Muitas vezes no trabalho fui tratada com total indiferença. Eu sempre me perguntava: “por que todos na sala foram convidados e apenas eu não? Viram todos, só não viram a mim?”. No decorrer de meus 53 anos, não fui vista inúmeras vezes… Isso foi doloroso, mas a pior parte foi quando acreditei neles e passei a não me ver também.
Precisei aprender a agir naturalmente quando as pessoas falam de mim, na minha frente, como se eu não tivesse condições de compreender o que está sendo falado. Precisei aprender a agir naturalmente quando as pessoas duvidam de minhas capacidades. Noto que preferem me desmerecer em vez de me ajudar, pois me ajudar requer tempo e paciência.
Hoje, trabalho numa clínica para autistas chamada Grupo Método e tenho bastante suporte. Eu necessito que organizem as minhas atividades, sozinha ainda não consigo. Não me sinto mais uma criminosa por ter estereotipias, antes eu era muito recriminada por isso.
Só pude ter oportunidades de trabalho adaptado depois que conheci Meca Andrade, uma analista do comportamento que me olhou e viu em mim uma pessoa capaz. Ela não sabe disso, mas naquele dia ela mudou toda a trajetória da minha vida. Com muita sensibilidade, ela viu que, antes do autismo, existia a Roseli.
Mas, quantas Meca Andrade precisamos ter para que todos os autistas possam ter uma oportunidade no mercado de trabalho? Sei que existem autistas com muito mais comprometimento do que eu, mas não menos capazes. Nossas necessidades de suporte são diferentes. Conheci uma autista arquiteta e achei sensacional. Conheço autistas que estão aprendendo a picotar papel e também acho isso sensacional. Vejo, na Clínica em que trabalho, como os autistas nível 2 e 3 de suporte vibram quando estão trabalhando. Lá, nós temos um café adaptado para eles, uns conseguem atender os clientes, uns conseguem colocar os produtos nas prateleiras, alguns carimbam papéis, mas todos têm uma função.
Vejo como eles ficam felizes de estarem sendo úteis. Por isso,acho que cada um é perfeito dentro das suas habilidades. Eu atendo o telefone, atendo as famílias que buscam informações, marco consultas e triagens, acompanho visitas e acho isso maravilhoso. Hoje, posso dizer que tenho orgulho de mim.
Quando entrei no Grupo Método eu só arquivava pastas. Com o tempo me desenvolvi bastante. Como toda pessoa autista, preciso de tempo, de paciência, preciso que compreendam que se eu perguntar a mesma coisa não é porque estou testando a sua paciência, eu realmente não entendi o que você me pediu. Me responda com carinho.Se está difícil para você, imagine para mim!
É preciso saber se vocês estão realmente dispostos a ter autistas trabalhando ao seu lado.
As pessoas quando pensam em inclusão já pensam em rampas, ou em braile. Que bom que estão pensando nessa população, mas nós precisamos de outros tipos de adaptações que envolvem um direcionamento mediado por vocês. Nós precisamos de recursos visuais e tecnológicos. Nós precisamos do seu precioso tempo, da sua boa vontade.
Vocês têm todas as oportunidades que a vida pode oferecer. Nós só temos vocês. Olhem para nós e nos aceitem, acreditem no nosso potencial.
Obrigada.