18 de junho de 2025

Tempo de Leitura: 3 minutos

Andréa Werner e Vanessa Ziotti*

Celebrado desde sua criação no Reino Unido, há duas décadas, o Dia do Orgulho Autista, neste 18 de junho, se propõe a combater o estigma e valorizar e reconhecer habilidades e talentos de pessoas como nós, autistas. No Brasil, segundo o último Censo, divulgado mês passado, somos 2,4 milhões de autistas, ou 1,2% da população.

Mas alguns dados do Censo inquirem: temos motivos para nos orgulhar? Nosso país realmente reconhece esses múltiplos talentos e habilidades?

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O Censo informou, por exemplo, que a maior parte dos autistas no Brasil está na faixa de 0 a 14 anos, e que mais de dois terços dos estudantes com autismo estão matriculados no ensino fundamental. E ainda que somente 12,3% dos autistas frequentavam o ensino médio na escola regular, percentual que despenca para 0,8% no ensino superior. O próprio IBGE, ao analisar esse percentual, ponderou que ele reflete os desafios de estudantes autistas para permanecer e progredir ao longo da trajetória educacional – principalmente diante de barreiras de acesso, adaptação curricular e apoio institucional adequado.

Os anos finais do ensino fundamental, e em especial o ensino médio, são sabidamente etapas escolares das mais desafiadoras à Educação Básica, seja pela aprendizagem, ou para garantir a permanência dos jovens na escola. Sem acessibilidade para autistas, tem-se uma evasão de dimensão ainda desconhecida, além do ingresso no mercado de trabalho seriamente comprometido.

Em 2023, pesquisa da revista Nova Escola com 4.725 educadores de todo o Brasil apontou que somente três de cada dez alunos com deficiência, autistas aqui incluídos, se envolvem efetivamente com as atividades em aula; além disso, quatro em cada dez profissionais diziam não ter recebido orientação especializada para as atividades com alunos com deficiência.

De volta ao Censo 2022, a realidade, ainda que emergida de uma amostra, volta a se impor: quase metade das pessoas com diagnóstico de autismo estava no grupo sem instrução e fundamental incompleto, 46,1%, índice acima do verificado na população geral, 35,2%.

Este ano, em julho, a Lei Brasileira de Inclusão (nº 13.146/2015) completa dez anos sem que a maior parte de seus artigos tenha sido até hoje regulamentada, como os que tratam de acessibilidade no mercado – para onde autistas estão tentando algum espaço após uma inclusão escolar deficitária.

“É finalidade primordial das políticas públicas de trabalho e emprego promover e garantir condições de acesso e de permanência da pessoa com deficiência no campo de trabalho”, diz o artigo 35 da LBI, um dos tantos ainda não regulamentados.

Dez anos depois, entretanto, as barreiras persistem. São Paulo, o Estado mais rico, tirou 5% do orçamento da educação a pretexto de destiná-lo à Saúde – um investimento que talvez ajudasse a conter a evasão de alunos com deficiência, autistas, e a garantir melhor formação para esses futuros profissionais.

O grande terror de muitas famílias atípicas, sobretudo mães que também são autistas, é a resposta à pergunta: “O que vai ser do meu filho quando eu morrer?” Muitos desses filhos poderiam estar exercendo sua plena cidadania com formação escolar, universitária e emprego. Ou então poderiam ter a possibilidade de recorrerem a residências inclusivas, também previstas na LBI como serviço de acolhimento institucional a pessoas com deficiência, especialmente aquelas que não possuem autonomia para morar sozinhas e/ou dependem de cuidados continuados. Mas nem mais esse trecho da lei foi ainda regulamentado, uma década depois, tampouco as residências são uma realidade que atenda à demanda – as privadas, quando existem, são caríssimas, e as públicas, em nosso Estado, são raríssimas.

Nós, autistas e familiares de autistas, queremos ter orgulho da nossa condição, mas, para isso, precisamos ter motivos mais concretos, menos subjetivos. E aí não depende só do nosso orgulho imenso pela autodescoberta: depende de políticas públicas e orçamento destinado a elas.

 

*Texto de Andréa Werner, com coautoria de:

Vanessa Ziotti (foto)  advogada especialista em direitos da pessoa com deficiência, autista e mãe de trigêmeos autistas.

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Andréa Werner, é deputada estadual pelo PSB em São Paulo, autista e mãe de um rapaz autista.

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