28 de junho de 2021

Tempo de Leitura: 3 minutos

O projeto Eu me Protejo, iniciado em 2018 pela jornalista Patrícia Almeida, trouxe à luz uma preocupação que muitos mantinham em silêncio: a violência sexual contra crianças e pessoas com deficiência. Patrícia é mãe de Amanda, uma jovem com síndrome de Down e autista, preocupada em encontrar formas de ensinar sua filha a proteger seu corpo de outras pessoas. 

Surgiu então a primeira versão do que seria a cartilha “Eu me Protejo”. Pouco a pouco, Patrícia foi reunindo profissionais de várias áreas, em diferentes estados do Brasil e no exterior, contando hoje com mais de 50 profissionais voluntários. A proteção contra a violência foi pauta de longas conversas. Com desenhos de compreensão universal e linguagem simples, a cartilha explica as partes do corpo e as partes íntimas, aquelas em que ninguém pode tocar sem a permissão da pessoa. 

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Nesse contexto, no ano de 2020 chegou uma doença que assolou o planeta. Um vírus desconhecido que voava livre pela sociedade infectando pessoas, levando muitas delas à morte. “Fiquem em casa” foi a ordem da Organização Mundial de Saúde, além do uso de máscaras e higienização das mãos. Muitas pessoas se recolheram aos seus domicílios e aguardaram que o vírus fosse combatido em curto espaço de tempo. Infelizmente essa história ainda não acabou. 

Dentro de casa, pessoas estudando em EAD, aumento do desemprego, a exaustão pelo uso contínuo de telas, a necessidade de buscar meios para esse uso, e milhares de pessoas sem acesso à internet, além da interrupção dos atendimentos às pessoas com deficiência e autistas. sses são ingredientes que tivemos (e continuamos a ter) para um aumento significativo da violência contra mulheres, crianças e pessoas com deficiência.

Segundo a revista Piauí, de 21 de abril de 2021, com dados de 2019, a cada hora temos 4 crianças sofrendo violência doméstica. A cada 15 minutos há uma criança sendo espancada ou violentada sexualmente. A violência sexual é o quarto maior índice quando falamos de violência contra a criança, segundo informações da Childhood Brasil. O índice é ainda maior quando falamos de violência contra pessoas com deficiência. Em maio de 2020, a CNN Brasil apontou um aumento de 47% das denúncias no Disque 100 ― canal de atendimento que recebe, analisa e encaminha denúncias de violação dos direitos humanos para os órgãos responsáveis ― ocorridas entre abril de 2019 e maio de 2020.

Diante de tal cenário, a resposta, além de políticas públicas urgentes para acompanhar os casos denunciados e evitar esse aumento, é a informação. 

Atualmente, o grupo colaborativo Eu me Protejo tem um site onde oferece uma cartilha em português, usando linguagem simples, com versões em libras, áudio descrição, espanhol, inglês, música e peça de teatro: ações totalmente pautadas na educação preventiva.

Em março de 2020 o Eu me Protejo auxiliou na campanha do uso de máscaras e, também em linguagem simples, procurou ilustrar para crianças pequenas e pessoas com deficiência o que é o vírus e como se proteger dele.

O Eu Me Protejo acredita que a solução do problema é evitar que ele ocorra. Quanto mais pais, professores, pediatras e profissionais da saúde divulgarem que a informação salva vidas, mais crianças serão protegidas.

A cartilha não é sobre gênero ou sobre sexualidade, é sobre conhecer seu próprio corpo e suas partes íntimas e como evitar que pessoas não confiáveis possam fazer coisas que as deixam desconfortáveis ou com vergonha. É sobre reconhecimento, respeito e se sentir dono de seu próprio corpo.

Um segundo ponto, não menos importante, é sobre o reconhecimento de sinais que possam indicar que a criança ou pessoa com deficiência esteja sofrendo violência. Toda e qualquer mudança brusca de comportamento – como insônia, ou hipersonia, diminuição ou aumento exagerado do apetite, hematomas pelo corpo, muitas quedas sem motivo, agressividade, isolamento, aumento ou surgimento de comportamentos de automutilação (puxar os cabelos, por exemplo), baixa no rendimento escolar, podem indicar que a criança esteja sofrendo violência física e/ou sexual. Um sinal é apenas um sinal, um conjunto deles indica que uma investigação mais cuidadosa precisa ser feita. Para pessoas e crianças autistas, o aumento dos SIB (self injurious behavior, ou comportamento auto lesivo, em português) de forma exagerada pode ser um sinal a ser avaliado mais de perto.

O site www.eumeprotejo.com.br oferece informações sobre a prevenção e os caminhos de denúncia e abre espaço para possíveis encaminhamentos.  O Disque 100 vem trabalhando de forma bastante eficiente, encaminhando muitos casos denunciados.

Se você sabe de alguma criança que esteja sofrendo maus tratos, denuncie. Você pode salvar vidas. Disque 100, a denúncia é anônima.

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É psicóloga clínica, terapeuta de família, diretora do Centro de Convivência Movimento – local de atendimento para autistas –, autora de vários artigos e capítulos de livros, membro do GT de TEA da SMPD de São Paulo e membro do Eu me Protejo (Prêmio Neide Castanha de Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes 2020, na categoria Produção de Conhecimento).

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