20 de janeiro de 2022

Tempo de Leitura: 3 minutos

Quando jovens, fazemos planos de vida com a carreira,  os afetos, o ser… Mas a vida nos expõe a situações avessas aos planos, e muitas vezes nos pegamos em papéis nunca sonhados, nem imaginados. Esse papel para mim é o de cuidadora.

Esse papel assumido pela necessidade e por ser mãe, aquela que por amor incondicional se propõe, na maioria das vezes, a fazer o que ninguém mais faria. Não que cuidar de um ser amado seja a pior das sentenças, mas tenho de assumir que o preço cobrado para minha saúde física e mental é alto. E isso não é culpa do cuidado, e sim das estruturas sociais que lançam a invisibilidade à cuidadora. Por que me sinto invisível? Porque a comunicação primeira acontece pelo olhar, se o outro não me vê, isenta-se de qualquer pedido de socorro meu, isenta-se do trabalho exaustivo, isenta-se de culpas ou de remorsos. Meu filho é invisível pela falta de comunicação que muitas pessoas autistas apresentam, eu sou invisível por ser a sombra dele.

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Ao escolher ser a cuidadora,  a princípio, afastei-me de meus sonhos profissionais, dos estudos, do lazer. Retomei os estudos muitos anos depois, mesmo com o ser cuidado ainda em minha responsabilidade, tornando minha jornada ainda mais pesada para concluir um dos sonhos que era o de estudar. Quanto ao trabalho formal, exerço esporadicamente, tendo de arcar com os custos financeiros de um “cuidador formal”, o que muitas vezes dilui os recursos recebidos pela metade. E o lazer? Meu lazer se tornou o trabalho formal, pois é quando saio por pouco tempo do ambiente doméstico.

Há pouco tempo, ouvi o termo “Síndrome do Cuidador Informal”… Trata-se de alterações físicas e psíquicas sentidas por quem se dedica ao cuidado ininterrupto de outrem. Dentre essas alterações, posso citar, no meu caso, ansiedade e depressão, fibromialgia, síndrome do pânico, depressão pós-parto, acumuladas nesses anos. Isso tudo afetou substancialmente as minhas relações sociais, imputando-me um isolamento maior, o que prejudica e muito minha qualidade de vida.

Quero também falar sobre a síndrome de Burnout, que se trata de uma exposição intensa e prolongada ao stress no local de trabalho, e se manifesta da seguinte forma: estado emocional negativo, associado à exaustão física e mental e à redução da motivação. Alguns dos sintomas são: ansiedade; depressão; stress; fadiga; etc. Qual pessoa que dedique uma vida inteira a ser cuidadora informal escapará?

Burnout apresenta três componentes que preciso relatar:  exaustão emocional,  despersonalização e redução da realização pessoal. Ou seja, vai ao encontro certeiramente do começo deste texto, dos resultados de minha escolha.  Essa convergência me faz pensar que a cuidadora ininterrupta sofre dos dois tipos de burnout simultaneamente, o burnout relativo ao trabalho e o burnout emocional, este pelo cansaço intenso de lidar com tantas emoções contidas e, ás vezes, controversa em relação àquele que é cuidado.

Sim, eu estou doente também, assumi isso há algum tempo, tento me tratar conjuntamente com os tratamentos de meu filho, mas confesso que não é suficiente. São 33 anos de cuidados ininterruptos, e me pego pensando que nunca tive férias, não sei qual foi a última festa a que fui, qual o meu último relacionamento pessoal que não fosse virtual…

Uma ferramenta de salvação tem sido as redes sociais, e a outra o projeto TEAcolher, do qual sou coordenadora. Esse projeto me ajuda na mesma medida em que ajudo. Para que as mulheres do projeto possam se espelharem e também buscarem suas curas, eu preciso me colocar bem, mostrar que, embora a sociedade nos faça doentes, podemos nos curar pela autoestima e pelo autocuidado, pelo apoio solidário que ofertamos umas às outras, pela felicidade que sentimos quando uma de nós diz “hoje estou feliz”. Os objetivos do projeto são o acolhimento, o empoderamento e o empreendedorismo, e temos encontrado umas nas outras a solidariedade, o afeto, a amizade, o apoio e a empatia. Isso só entende realmente o significado é quem vive o papel de cuidadora.

O TEAcolher é o lugar em que me sinto cuidada, é meu principal lugar de cura.

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Atualmente na vice-presidência da onda-autismo, a professora Claudia Moraes é pedagoga, especialista em educação na perspectiva do ensino estruturado e é mestre em educação com especialização para formação de professores.

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