3 de setembro de 2021

Tempo de Leitura: 3 minutos

Depois de um ano e meio de espera, a tão aguardada quarta temporada de Atypical chegou às telas de streaming no início de julho e não decepcionou os fãs. Desde seu lançamento em 2017, a série teve um processo de amadurecimento paralelo ao de seus personagens, com o mérito de ter lidado com temas relevantes: abandono, separações, relações extra-conjugais, homoafetividade e muito, muito papo sobre o polo sul e, claro, pinguins. Tudo isso sem perder o fio da meada: a trajetória do personagem adolescente autista, Sam (Keir Gilchrist), rumo à sua maturidade e autonomia.

Desde o início, o recado da criadora da série, Robia Rashid, era de ajudar o mundo a entender como é viver para as pessoas no espectro do autismo e entregar essa “lição” num pacote com humor e sensibilidade.

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Já no primeiro episódio fica claro que Sam ama pinguins e tem um hiperfoco: a Antártida. Nesta quarta temporada, ele faz do seu hiperfoco um objetivo de vida – ao menos de sua vida no momento – e busca todos os meios de viabilizar o sonho de viajar e estudar a vida dos pinguins. 

Mas, uma qualidade de Atypical é ser sobre mais que os desafios de Sam. Casey (Brigette Lundy-Paine), a irmã mais nova, de pavio curto e ao mesmo tempo protetora, continua competindo com o próprio irmão. A personagem, que vai crescendo em complexidade durante a série e causa tanto interesse no público quanto Sam, tem seu próprio fã-clube querendo saber o desfecho para os dilemas mais marcantes de sua vida: carreira e relação amorosa. A série, mais uma vez, traz o inesperado, e debate os desafios “sobre-humanos” que a jovem tem de enfrentar como aspirante a uma vaga na UCLA (Universidade da Califórnia em Los Angeles) – top 10 entre as universidades – ingressando como atleta. A trama questiona se a espiral em que os dias de Casey se transformam é a realização que ela busca de fato, e se valerá a pena no fim. 

Já que as relações complexas entre autistas e seus irmãos têm sido pouco exploradas nas telas, outro mérito da série é manter a atenção e se aprofundar em Casey, que com boa atuação de Brigette Paine, não apenas convence, como chega a roubar o foco de episódios para si, sem abandonar Sam. 

Outro ponto a favor nesta temporada é aumentar a participação dos colegas de faculdade de Sam – que são majoritariamente interpretados por atores que têm algum tipo de deficiência ou necessidade especial. Melhor ainda é constatar que essa estratégia resulta em mais sinceridade na atmosfera e no humor proposto, e que ao dar mais espaço a esses personagens, os realizadores aumentaram a empatia com o público.

Por outro lado, para quem convive em família com o autismo, ainda fica a desejar no quesito de ir além e reconhecer os “atípicos” não verbais, tipicamente esquecidos no espectro quando se trata de retratá-los em texto ou em telas. Frustra-se, nesse aspecto, o desejo de querer aplaudir mais.

Outro ponto fraco a ser apontado, agora que podemos analisar a série como um todo, é a personagem Elsa Gardner (Jennifer Jason Leigh), a mãe de Sam. Depois de um começo interessante na primeira temporada, com o seu caso com um bartender, sua expulsão de casa e posterior arrependimento, a personagem parece ter tido uma completa mudança de personalidade na sequência da história, sendo excessivamente protetora e se sentindo na necessidade de se fazer presente em um nível quase caricato. Parte do problema recai na atuação: Jennifer Leigh, que já não “veste” a personagem, parece forçar um espírito infantil, tanto como mãe quanto como mulher. Idealmente, ao se escrever uma história, é bom ter a personalidade de seus personagens bem estabelecida. Com isso, a experiência da escrita pode até levar a narrativa a lugares inesperados para o próprio escritor, em vez de seguir um plano restrito. Este não parece ser o caso aqui. Ou houve uma mudança brusca no que pretendiam que a personagem fosse, ou tinham um objetivo final para ela com o qual as mudanças ocorridas ao longo do caminho acabaram não combinando.

Entre prós e contras (como nas listas de Sam para tomar decisões), a quarta temporada mostra uma boa conclusão para uma boa série. O suporte que ele recebe dos amigos e da família nos faz perceber o progresso de Sam ao longo dos anos. Sua jornada em busca da Antártida é fantástica sem ser piegas, e nos mostra que ele nunca esteve ou estará sozinho nas horas importantes de sua vida. 

Pode-se dizer que essa é uma série que muitos fãs, inclusive eu, certamente desejarão, em algum momento, rever. 

A quarta e última temporada de Atypical está exclusivamente na Netflix.

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É videomaker, fotógrafo e editor, graduado em Cinema, Rádio e TV e irmão de Rafael, autista adulto.

Beijo na vaquinha

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